quarta-feira, 29 de junho de 2011

Tiroteio no Colombo: vigilância e segurança privada

Na sequência do “Tiroteio no Colombo” ocorrido no passado dia 25 de Junho e noticiado pela LUSA e outros órgãos de comunicação social, o Diário de Notícias noticiou que a Associação Nacional de Vigilantes (ANV) reclamou mais poderes para os seguranças privados poderem intervir nestes casos, nomeadamente, a utilização das armas eléctricas, vulgarmente conhecidas por taser.
Como é habitual nestas circunstâncias, o enfoque da discussão está descentrado.
Sabe-se por experiência e reflexão científica que o aumento de meios coercivos para responder a ameaças tende a agravar o potencial da agressão.
Ou seja, armar os seguranças privados com essas ou outras armas, significará a breve trecho, um aumento da gravidade das agressões violentas a seguranças privados.
O objectivo deste blogue é incentivar a prevenção da criminalidade, especialmente aquela que atinge o comércio e dentro deste, especialmente o tradicional utilizando metodologias inteligentes e passivas, assentes em conhecimentos científicos e práticos da criminologia, aplicando a análise de risco e a alteração do meio e da conduta da potencial vítima.
A prevenção do crime faz-se, essencialmente, através da intervenção na cadeia de factos e acontecimentos que proporcionam e potenciam o delito.
Isso deve acontecer através da (1) imposição de condicionantes à motivação humana e (2) através da redução das oportunidades.
Neste prisma, não podemos deixar de criticar de forma útil e construtiva quaisquer posturas que pugnam por um aumento dos meios coercivos dos cidadãos (sejam ou não seguranças privados), como forma de prevenção do crime.
Apesar da popularidade do argumento, mais armas, simplesmente não resolvem o assunto!
O caminho é o inverso e sobre a missão da segurança privada, há que compreender o seguinte:
1.    A segurança privada é “subsidiária e complementar da actividade das forças e dos serviços de segurança pública do Estado” (artigo 1.º, n.º 2 do Decreto-lei n.º 35/2004, de 21 de Fevereiro) e apesar da sua importância, quer na protecção de pessoas e bens quer na prevenção e dissuasão da prática de actos ilícitos, ela continua a ser distinta da segurança pública porque tem um carácter exclusivo, ou seja, o seu objectivo é essencialmente a protecção de interesses privados em domínio privado.
2.    Contrariamente à segurança privada, as forças e serviços de segurança têm um carácter inclusivo, ou seja, servem todos e não apenas alguns.
3.    O interesse público da segurança privada, a que alude o actual quadro legislativo não pode ser dissociado da componente de exclusividade do seu serviço, bem como do carácter complementar e a subsidiário da actividade face às competências desempenhadas pelas forças e serviços de segurança.
4.    Esse “interesse público” existe de facto e tem diversas dimensões das quais destacamos algumas que julgamos mais importantes:
a.    A existência de segurança privada legal a operar regularmente em domínio privado, alivia a carga das forças e dos serviços de segurança, porque a sua existência em determinados espaços garante a vigilância e a prevenção de condutas lesivas e, se estiver bem organizada e percebendo bem o seu objectivo, proporciona a comunicação atempada e correcta dessas condutas às forças e serviços de segurança apenas quando as mesmas ocorrem e, assim, permite que as forças e serviços de segurança possam empenhar mais recursos, durante mais tempo, na vigilância dos espaços públicos;
b.    A existência de vigilantes bem identificados junto de uma determinada “clientela” deve invocar em primeiro lugar um auto-controlo de cada indivíduo pertencente ao grupo da “clientela” – os contratantes e os beneficiários colaterais do serviço de vigilância.
c.    Um dos aspectos importantes da prevenção criminal com recurso às teorias da prevenção situacional (Clarke) e do policiamento orientado (Goldstein) é a redução de factores de provocação da conduta lesiva / criminosa / indesejável. A postura amistosa e colaborante de um vigilante presente, firme e com soluções para oferecer é mais importante do que um guarda pronto a expulsar ou deter alguém com recurso à postura ameaçadora, ao músculo ou a qualquer tipo de arma.
d.    Na possibilidade ou eminência dessa necessidade, o segurança privado deve recorrer às forças de segurança.
5.    Assim, o segurança privado deve funcionar cada vez mais como um assistente e menos como um guarda se quiser obter bons resultados na prevenção de condutas indesejáveis – o seu papel não é repressivo e a sua postura não deve ser militarista. Na medida do possível e contrariamente ao que acontece em Portugal, a sua apresentação deve ser menos agressiva, não recorrer a uniformes de estilo militar e abandonar ideários militaristas, da força, da reposição da ordem e da repressão criminal – não é esse o seu papel!!!
6.    A segurança privada deve estar tão próxima quanto possível de uma participação da sociedade civil na segurança individual e colectiva.
A segurança privada é um recurso de segurança valioso porque introduz o factor humano da vigilância, personalizando-a e emprestando ao dispositivo ou sistema de segurança de um estabelecimento ou espaço privado, a capacidade de interacção com o cliente de forma não opressiva.
Na grande maioria das vezes, o papel do segurança privado no domínio privado é o de prestador de informações e de orientador do cliente. Esse papel é idêntico à maior parte da actividade policial em domínio público.
Actualmente, o regime jurídico da segurança privada prevê actores novos. O preâmbulo do Decreto-lei n.º 35/2004, de 21 de Fevereiro indica claramente que o director de segurança bem como os formadores de segurança privada vão dispor de formação específica especialmente dirigida à obtenção dos conhecimentos teóricos e práticos necessários para que o pessoal de vigilância desempenhe cabalmente as suas funções”.
Ora, seria desejável que essa formação assentasse primordialmente nos aspectos da verdadeira prevenção, focando especialmente a Teoria da Prevenção Situacional e as teorias de suporte como a Routine Activity Theory, a Criminologia Ambiental e a Teoria criminológica da Escolha Racional.
Voltaremos a este assunto. Até breve!

Leia ainda: Routine Activity Theory

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